Heartless - 1/ It's like an angel

 

"Mas hoje dou valor de verdade

Pra minha saúde, pra minha liberdade

Que bom te encontrar nesta cidade"
                                  Charlie Brown Jr.

    Acordo com  um fraco feixe  luz atravessando as cortinas e vindo diretamente em meus olhos. Abro os mesmos e olho para o lado verificando se minha melhor amiga e colega de quarto, Lizzie, ainda estava dormindo. Lá estava ela com seus fios loiros ninhados e suspiros pesados. Talvez estaria sonhando com seu novo namorado, Ryan Butler. O cara era do estilo "pegador" mas aparentava ter coração. Ele era loiro com os olhos azuis, assim como os de Lizzie. Se eles não fossem namorados eu iria jurar que seriam irmãos. Já disse inumeras vezes a ele que se algum dia ele resolver magoar minha amiga, eu acabaria com ele. Ryan sempre ria com o nariz como se eu não apresentasse perigo algum - e não apresentava - e dizia: "Eu não vou quebrar o coração da sua amiga. Fique tranquila, baixinha."

   Desde que fui para o Internato Marbachk, Lizzie fora a minha unica e melhor amiga. No começo apenas trocávamos favores com lições, mas mudamos de classe e por mais estranho que pareça, nossa amizade tornou-se mais forte. Nos viamos somente depois da aula quando iamos para o nosso quarto. Contávamos as novidades e fofocas da manhã uma para a outra e riamos descontroladamente. Lizzie era uma das poucas garotas do internato que falavam comigo e não eram esnobes. Ela era amiga como uma irmã e as vezes protetora como uma mãe. 

  Jogo minhas pernas para fora da cama e procuro com os pés o meu chinelo. Deslizo meus pés nele e me levanto indo em direção ao guarda-roupas. Pego o uniforme do internato para alunos e o visto. Penteio meus cabelos e o deixo solto, prendendo apenas por uma trança atrás.

-Lizzie? - chamo - Lizzie, acorda. Você vai se atrasar.
-Ryan? - disse ainda sonhando
-Não, Jessie. Sua amiga. Levante Lizzie, vou jogar água gelada em você.

 Lizzie levantou no mesmo instante. Resmungou algumas coisas com palavreados chulos

-Estou indo, tudo bem? Nos vemos mais tarde... - disse abrindo a porta do quarto
-Tchau Jessie, boa aula.
-Na medida do possível. - sorri fraco e fechei a porta

  Os corredores do Marbachk na parte da manhã sempre ficavam lotados de meninas perambulando e marchando até sua devida sala de aula. Eu só precisava passar por dois corredores e virar a esquerda e logo eu chegava na sala 16 e voltaria a ver minha querida e louca professora de História.

 Helena era a pessoa mais perturbada que eu já havia visto na vida. As vezes ela era tão doce quanto uma amora, mas dois minutos depois ela já agiria de outra forma com você sendo impaciente e ignorante. Mas tudo bem, três anos naquele lugar e eu já estava acostumada com essas atitudes estranhas de alguns.

  Mais alguns passos e eu estaria voltando a aquela entediante e monótoma sala de aula. O sinal soou e a professora de História entrou na sala. Pensei em correr até a porta, mas ela foi fechada antes mesmo que eu conseguisse raciocinar. Mesmo assim não desisti. Corri até a porta e bati duas ou três vezes. A professora Helena abriu e me olhou com um certo desprezo.

-De novo Jessie? Já é a segunda vez em uma semana. Vá para a diretoria, dessa vez não irei perdoar.

   Na terça-feira, eu havia me atrasado novamente. Mas nessa vez era atraso de verdade, o despertador não tocou e nem o sol me ajudou invadindo meu sono pesado.

-Mas professora, eu estava aqui - me manifestei.
-Se estivesse aqui, você não estaria ai - a ruiva se enrolou ao falar.
-O que?

   A professora não deixou ao menos que eu terminasse de me explicar e com toda a ignorância do mundo voltou a fechar a porta na minha cara. Olhei para os lados e vi que os corredores já estavam vazios. Apenas eu, Jessie Collins indo para a diretoria em plena sexta-feira por ter chego "atrasada" na sala de aula. Na verdade, eu nem tinha pisado na sala.

  Fiquei me perguntando se Lizzie havia chego a tempo ou se sua professora era tão legal e amiga quanto a minha. Certamente se ela havia chegado atrasada, ela conseguiria entrar. Só eu sabia o quão cara de pau Lizzie era. Ela fazia uma carinha de cachorro sem dono e qualquer pessoa caia na lábia dela.

   Segui até a diretoria com a cabeça baixa. Estava com medo que a diretora, a unica que demonstrara afeto comigo desde que cheguei, ficasse decepcionada ou então me rejeitasse assim como todos costumavam a fazer. Mas talvez isso não fosse mais importar, o ano letivo estava acabando. Mais algumas semanas e eu não teria mais que frequentar o Internato Marbachk, isso é, se meu pai voltasse a tempo. Eu não tinha mais esperanças referente a minha mãe, ela estava virando uma louca.

  Mais um pouco e eu estaria frente a frente com a diretora. Ela certamente falaria algo do tipo: "Jessie, o que anda acontecendo com você?" ou então quando eu saísse da sua sala mandaria alguém me vigiar para ver se eu estava fazendo algo de errado. A pergunta era: O que eu faria de errado em um internato longe de tudo e de todos, apenas com meninas metidas e problemáticas? Tudo bem, eu confesso que de vez em quando eu fugia a noite com a Lizzie para ir em festas do novo namorado dela, mas nunca passava disso. Rezo todas as noites para que ninguém nunca ouse pensar nessas fugidas se não estamos ferradas. Também tinha o internato São Manuel para meninos, era perto do Marbachk, mas nenhuma menina poderia ao menos pensar em manter contato com os meninos de lá. Nosso  internato era realmente rígido.

  Bati algumas vezes na dupla porta de madeira e ninguém se manifestou. Pude ver que ela não estava totalmente fechada, mas sim encostada. Eu já fazendo minhas orações para a diretora não brigar comigo ou coisas do tipo. Eu tentava não ligar, demonstrar afeto e etc, eu tentava parecer curta e seca mas ela sabia que dentro de mim, havia uma menina doce e confusa.

 Já passei por tantas coisas na vida, tantas decepções e cheguei até mesmo a entrar em depressão mas sempre consegui ser forte o bastante para sair dessa.  Pelo menos, era o que eu achava. Culpa da sociedade tola que insiste em nos julgar até mesmo por respirar.

  Empurrei a porta de leve tentando esconder a minha cara de tacho. A madeira fez ruídos como sempre, então resolvi parar com aquele suspense e abrir a porta de vez.

  Eu esperava ver a pequena diretora atrás de sua mesa, lendo seu bom e velho livro de sempre, fazendo anotações e com os óculos meio caídos  mas não foi isso o que eu vi.

 Diante de mim, estava a criatura das mais belas e perfeitas por fora com os pés em cima da mesa de um jeito arrogante como se fosse o dono do mundo. Seu cabelo era de um tom loiro puxado para o dourado, olhos cor de mel e traços extremamente angelicais.

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Continua com 17 comentários. Digam o que acharam desse primeiro capitulo. - Lee